O cinema brasileiro tem uma trajetória rica e diversificada que se estende desde seus primórdios no final do século XIX até a atualidade. Ao longo de mais de um século, a sétima arte no Brasil se desenvolveu passando por diferentes fases e estilos, refletindo as transformações culturais, sociais e políticas do país. Nesta seção, vamos conhecer um pouco sobre a história e as as etapas marcantes da produção cinematográfica brasileira, como o pioneirismo dos irmãos Segreto, o movimento modernista do Cinema Novo, o resgate do imaginário popular por Amácio Mazzaropi e pela Pornochanchada, a chamada Retomada do cinema nacional nos anos 1990 e o cinema contemporâneo do século XXI, que abarca uma ampla gama de narrativas e estéticas. Essa evolução notável é resultado do talento e da persistência de cineastas, atores e técnicos que, apesar das adversidades, conseguiram consolidar o Brasil como um produtor relevante de obras audiovisuais no cenário mundial.
O início de uma trajetória (anos 90 do s. XIX – início do s. XX)
O cinema chegou ao Brasil em 1896, poucos meses depois da primeira exibição pública dos irmãos Lumière em Paris. No dia 8 de julho daquele ano, o empresário belga Henri Paladino apresentou uma série de filmes curtos retratando o cotidiano nas cidades europeias no Rio de Janeiro, para um público seleto de convidados. A primeira sessão aberta ao público ocorreu no dia 14 de julho, no salão do antigo Jornal do Commercio. As primeiras filmagens realizadas no Brasil são atribuídas aos irmãos italianos Paschoal e Affonso Segreto, que registraram imagens da Baía de Guanabara em 1898.
Baía da Guanabara (1898) | Paschoal Segreto e Affonso Segreto
Outros pioneiros do cinema nacional foram Francisco Marzullo e Antônio Leal, que produziram o filme, Os Estranguladores (1908), baseado em caso real, o filme de 40 minutos conta a história de dois adolescentes, sobrinhos de um dono de joalheria, que são brutalmente mortos por uma quadrilha de contrabandistas; também é importante mencionar o cineasta Francisco Santos, que dirigiu o primeiro longa-metragem nacional, O Crime dos Banhados (1914), baseado uma reconstituição de um crime real: uma chacina no interior do Rio Grande do Sul matou toda a família de um pequeno proprietário rural, causando comoção na sociedade local e suscitando a dúvida sobre o verdadeiro motivo dos assassinatos. Desafortunadamente, parece não haver imagens desses filmes disponíveis na atualidade.
De toda forma, no início do século XX, o cinema brasileiro era predominantemente documental e retratava aspectos da vida urbana, da natureza e dos eventos históricos. As salas de cinema se multiplicaram nas principais cidades do país, porém, a maior parte dos filmes exibidos era importada da Europa e dos Estados Unidos. A falta de eletricidade e de equipamentos adequados dificultava a produção nacional, que dependia da iniciativa dos próprios exibidores.
Ciclos regionais (Anos 20 e 30 do s. XX)
A partir da década de 1920, o cinema mudo brasileiro se expandiu para outras regiões do país, dando origem aos chamados ciclos regionais. Esses ciclos foram movimentos cinematográficos que surgiram em distintas partes do país, com características próprias e temáticas variadas. Eles representaram uma tentativa de descentralizar e diversificar a produção nacional, além de resistir à hegemonia do cinema estrangeiro.
O Ciclo do Recife, um movimento regional destacado, teve como principal figura Jota Soares, um habilidoso cineasta responsável por diversos filmes, entre documentários e ficções. Um exemplo é “A Filha do Advogado” (1926), considerado o primeiro filme nordestino, que narra a história de Heloisa, filha biológica do advogado Dr. Paulo Aragão, enfrentando dilemas entre o amor e a família. Essa fase do cinema brasileiro foi altamente significativa e produtiva, com a produção de 13 longas-metragens por diferentes cineastas renomados.
Entre os clássicos produzidos, estão “Retribuição” (1924), dirigido por Gentil Roiz, que conta a aventura de uma jovem em busca de um tesouro com a ajuda de um galã, enfrentando bandidos; “Jurando Vingar” (1925), sob a direção de Ary Severo, narrando a história de Julio, que busca vingança após sua irmã ser assassinada e sua amada sequestrada; “Aitaré da Praia” (1925), também dirigido por Gentil Roiz, mostrando um jovem pescador, Aitaré, que se apaixona por Cora e salva a vida de um coronel e sua filha; e “Revezes” (1927), com a direção de Chagas Ribeiro, explorando as reviravoltas do destino na vida de Jacinto, um fazendeiro violento e seu filho perverso. De maneira geral, o Ciclo do Recife era marcado pela abordagem de temas como cultura regional, crítica social e humor popular, proporcionando um retrato vívido e autêntico do Nordeste brasileiro daquela época.
A filha do Advogado (1926) | Jota Soares
Retribuição (1924) | Gentil Roiz
Jurando Vingar (1925) | Ary Severo
Aitaré da Praia (1925) | Gentil Roiz
Revezes (1927) | Chagas Ribeiro
O Ciclo de Cataguases, liderado pelo cineasta Humberto Mauro, destacou-se no cinema brasileiro valorizando a paisagem rural, a cultura caipira e a estética expressionista. Dentre suas obras, estão “Tesouro Perdido” (1927), um filme mudo sobre a busca de um tesouro e a luta contra bandidos que sequestram uma jovem; “Brasa Dormida” (1928), que narra o romance entre um gerente de fábrica e a filha do dono, culminando em uma luta mortal; e “Sangue Mineiro” (1929), que acompanha a vida de Carmen, uma jovem desesperada que cogita tirar a própria vida após descobrir a infidelidade de seu amado. Esses filmes ilustram o talento de Humberto Mauro e a importância do Ciclo de Cataguases na história do cinema brasileiro.
Tesouro Perdido (1927) | Humberto Mauro
Brasa Dormida (1928) | Humberto Mauro
Sangue Mineiro (1930) | Humberto Mauro
Por outro lado, a produção cinematográfica no Rio de Janeiro, que era a capital do Brasil na época, experimentou um período de grande desenvolvimento durante a década de 1930. Essa evolução foi marcada pela influência considerável do cinema estado-unidense e pela transição do cinema mudo para o sonoro. Adhemar Gonzaga, um dos cineastas mais destacados dessa época, fundou a Cinédia, uma das primeiras e mais inovadoras produtoras de filmes no Brasil. Gonzaga foi responsável por produzir obras icônicas, como “Lábios Sem Beijos” (1930), um filme dirigido por Humberto Mauro, cuja trama acompanha a história de uma jovem mulher de uma família rica que é cortejada por seu primo Paul, mas enfrenta problemas de ciúmes ao acreditar que ele está tendo um caso com sua irmã. Já “Ganga Bruta” (1933), também dirigido por Humberto Mauro, conta a história de um jovem que, após descobrir que sua noiva não era virgem na noite do casamento, mata-a em um acesso de raiva. Absolvido, ele se muda para o interior para trabalhar em uma construção.
Lábios sem beijos (1930) | Humberto Mauro
Ganga Bruta (1933) | Humberto Mauro
Outras produções cinematográficas importantes dessa década foram “Limite” (1931), dirigido, escrito e produzido por Mário Peixoto, um marco do cinema latino-americano que apresenta três personagens perdidos no mar em um barco a remo, com seus passados conturbados sendo revelados através de flashbacks; e “O Grito da Mocidade” (1936), um filme brasileiro dirigido por Raul Roulien que retrata a vida de cinco jovens estagiários médicos na ala de emergência de um hospital no Rio de Janeiro, abordando as dificuldades e desafios enfrentados pelos personagens em meio a um ambiente de trabalho intenso. Além disso, o musical “Alô, Alô, Carnaval!” (1936), dirigido por Wallace Downey, se destacou ao apresentar renomados cantores populares do país, como Carmen Miranda e Aurora Miranda, em uma trama envolvente que celebra a cultura brasileira e a música popular, com roteiro assinado pela talentosa dupla João de Barro e Alberto Ribeiro.
Limite (1931) | Mario Peixoto
O Grito da Mocidade (1936) | Raul Roulien
Alô, Alô, Carnaval! (1936) | Wallace Downey
Luzes, Câmera e Transformações (Anos 40 e 50 do s. XX)
A produção cinematográfica brasileira nas décadas de 1940 e 1950 foi marcada por um contexto histórico de transformações políticas e culturais no país. Durante esse período, a indústria cinematográfica nacional se consolidou com gêneros populares e a criação de estúdios influentes, como a Atlântida Cinematográfica e a Vera Cruz. Além disso, o Estado Novo, governo de Getúlio Vargas, desempenhou um papel importante no incentivo à produção cinematográfica e na censura de temas e conteúdos.
Na década de 1940, as Chanchadas dominaram o cenário cinematográfico brasileiro. Produzidas principalmente pelo estúdio Atlântida Cinematográfica, essas comédias musicais leves e populares traziam paródias de filmes estrangeiros, humor e música. Alguns filmes notáveis dessa época incluem “Carnaval no Fogo” (1949), de Watson Macedo, que gira em torno de um triângulo amoroso entre personagens interpretados por Oscarito, Eliana e Otelo Zeloni, ambientado no contexto do Carnaval do Rio de Janeiro; “Nem Sansão nem Dalila” (1954), de Carlos Manga, uma comédia estrelada por Oscarito e Grande Otelo, que faz paródia do clássico bíblico; e “Aviso aos Navegantes” (1950), de Watson Macedo, com uma trama que envolve uma herança e diversos personagens cômicos.
Carnaval no Fogo (1949) | Watson Macedo
Nem Sansão Nem Dalila (1954) | Carlos Manga
Aviso aos Navegantes (1950) | Watson Macedo
Além das chanchadas, a década de 1940 testemunhou produções que abordavam temas mais profundos e dramáticos. “Argila” (1940), de Humberto Mauro, um drama rural que aborda questões de terra, trabalho e injustiça social no interior do Brasil. “O Ébrio” (1946), de Gilda de Abreu, mergulha na vida de um compositor talentoso em batalha contra o alcoolismo, buscando redenção.
Argila (1940) | Humberto Mauro
O Ébrio (1946) | Gilda de Abreu
Nos anos 1950, o estúdio Vera Cruz, fundado em 1949 em São Paulo, buscou elevar o cinema brasileiro ao nível das produções internacionais, investindo em qualidade técnica e artística. Apesar de sua curta existência, encerrada em 1954, a Vera Cruz produziu filmes importantes, como “Tico-Tico no Fubá” (1952), de Adolfo Celi, que aborda a vida do músico Zequinha de Abreu e seu envolvimento com a política e a cultura do interior de São Paulo; e “Sinhá Moça” (1953), de Tom Payne e Oswaldo Sampaio, um drama baseado no romance de Maria Dezonne Pacheco Fernandes, que conta a história de amor entre um jovem abolicionista e uma jovem filha de fazendeiro escravocrata.
Tico-Tico no Fubá (1952) | Adolfo Celi
Sinhá Moça (1953) | Tom Payne e Oswaldo Sampaio
Durante esse período, cineastas como Alberto Cavalcanti e Humberto Mauro se destacaram com filmes que exploravam a realidade social e cultural brasileira, como “Caiçara” (1950), de Alberto Cavalcanti, um drama sobre a luta de uma jovem e seu pai contra a exploração de trabalhadores no litoral paulista; “O Canto da Saudade” (1952), de Humberto Mauro, um documentário sobre a cultura e a música popular brasileira, retratando festas religiosas e profanas no interior de Minas Gerais; “Rio, 40 Graus” (1955), de Nelson Pereira dos Santos, um dos primeiros exemplos do Cinema Novo, que apresenta uma visão crítica da vida nas favelas do Rio de Janeiro.
Caiçara (1950) | Alberto Cavalcanti
O Canto da Saudade (1952) | Humberto Mauro
Rio, 40 Graus (1955) | Nelson Pereira dos Santos
Além desses cineastas, outros diretores também contribuíram para a diversidade temática e estilística do cinema brasileiro na época. Por exemplo, “Ângela” (1951), de Abílio Pereira de Almeida, retrata a vida de uma mulher que enfrenta preconceitos e desafios ao se tornar a primeira mulher taxista do Rio de Janeiro, e “Amei um Bicheiro” (1952), de Jorge Ileli e Paulo Wanderley, que traz a história de amor entre uma mulher de classe alta e um homem envolvido com o jogo do bicho. “A Dupla do Barulho” (1953), dirigido por Carlos Manga, é uma comédia que acompanha as divertidas aventuras de dois amigos, interpretados por Grande Otelo e Oscarito, que se metem em confusões e desentendimentos enquanto tentam superar as adversidades do cotidiano.
Ângela (1952) | Abílio Pereira de Almeida
Amei um Bicheiro (1952) | Jorge Ileli e Paulo Wanderley
A Dupla do Barulho (1953) | Watson Macedo
Em conclusão, as décadas de 1940 e 1950 foram fundamentais para a consolidação do cinema brasileiro. A popularidade das chanchadas e o surgimento de estúdios importantes como Atlântida Cinematográfica e Vera Cruz, bem como cineastas engajados na exploração da realidade brasileira, refletem um período de crescimento e transformação na indústria cinematográfica nacional, no contexto das mudanças políticas e culturais da época. Essa diversidade de produções e temas pavimentou o caminho para o desenvolvimento de movimentos cinematográficos posteriores.
Cinema Novo e Cinema Marginal (anos 60 do s. XX)
A década de 1960 foi um período de grandes transformações no cinema brasileiro, com a emergência do Cinema Novo e do Cinema Marginal. O Cinema Novo, liderado por Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e outros diretores, foi um movimento que buscava romper com o modelo tradicional de produção e se inspirava no Neorrealismo italiano e na Nouvelle Vague francesa. Seus filmes abordavam temas políticos e sociais, e tinham como objetivo “uma estética da fome”, conforme expresso pelo próprio Glauber Rocha. Entre os principais filmes do Cinema Novo, destacam-se “Vidas Secas” (1963), “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964) e “Terra em Transe” (1967).
Vidas Secas (1963) | Nelson Pereira dos Santos
Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) | Glauber Rocha
Terra em Transe (1967) | Glauber Rocha
O Cinema Marginal, também conhecido como Cinema de Invenção, foi uma vertente mais radical e experimental do cinema brasileiro, que procurava subverter as convenções cinematográficas e questionar a ordem estabelecida. Seus principais representantes foram Rogério Sganzerla, Júlio Bressane e Andrea Tonacci, que realizaram filmes como “O Bandido da Luz Vermelha” (1968), “Matou a Família e Foi ao Cinema” (1969) e “Bang Bang” (1971).
O Bandido da Luz Vermelha (1968) | Rogério Sganzerla
Matou a Família e Foi ao Cinema (1969) | Júlio Bressane
Bang Bang (1971) | Andrea Tonacci
Por outro lado, o cineasta José Mojica Marins, conhecido como Zé do Caixão, ganhou notoriedade nessa época com trilogia: “À Meia-Noite Levarei Sua Alma” (1964), “Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver” (1967) e “Encarnação do Demônio” (2008). Mojica Marins criou o icônico personagem Zé do Caixão, que se tornou um símbolo do cinema de horror brasileiro e foi interpretado pelo próprio diretor. Seus filmes eram caracterizados pelo baixo orçamento, pela atmosfera sombria e pelos temas macabros, conquistando um público fiel tanto no Brasil quanto no exterior.
À Meia-Noite Levarei Sua Alma (1964) | José Mojica Marins
Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver (1967) | José Mojica Marins
Encarnação do Demônio (2008) | José Mojica Marins
Também é importante mencionar Amácio Mazzaropi, um cineasta e ator brasileiro icônico, que dedicou sua carreira a retratar a vida e os dilemas dos caipiras, o homem do campo e a cultura rural brasileira. Seu estilo característico combinava humor, crítica social e elementos da cultura popular, com ênfase na linguagem típica dos caipiras. Entre os principais filmes de sua carreira, destacam-se “Jeca Tatu” (1960), “Casinha Pequenina” (1963) e “O Jeca e a Freira” (1968), que abordavam temas como injustiça social, desigualdades e o embate entre tradição e modernidade. A despeito das limitações do mercado cinematográfico brasileiro e do contexto autoritário da ditadura militar (1964-1985), Mazzaropi conseguiu atrair um grande público, estender sua produção até a década de 1980 e consolidar-se como uma figura emblemática da identidade cultural do país.
Jeca Tatu (1960) | Amácio Mazzaropi
Casinha Pequenina (1963) | Amácio Mazzaropi
O Jeca e a Freira (1968) | Amácio Mazzaropi
Pornochanchada (anos 70 do século XX)
A Pornochanchada surgiu como uma resposta à demanda popular por entretenimento e escapismo, bem como uma maneira de contornar a censura e abordar questões políticas e sociais. Filmes emblemáticos desse gênero incluem “A Super Fêmea” (1973), dirigido por Aníbal Massaini Neto, que conta a história de uma cientista que cria um soro capaz de transformar mulheres em objetos sexuais perfeitos; “A Dama da Lotação” (1978), sob a direção de Neville d’Almeida, narrando a trajetória de uma jovem que, após ser violentada, passa a seduzir e vingar-se de homens em transportes públicos; e “Bonitinha, mas Ordinária” (1981), comandado por Braz Chediak, que adapta a obra de Nelson Rodrigues sobre um homem dividido entre o amor e o dinheiro.
Vale a pena mencionar que a maior parte dos filmes do inicício da década de 1970 e do início da década de 1980 têm restrição de idade. Portanto, os filmes abaixo não podem ser vistos diretamente nesta página, porém estão disponíveis no Youtube ao se clicar nos links.
A Super Fêmea (1973) | Aníbal Massaini Neto
A Dama da Lotação (1978) | Neville d’Almeida
Bonitinha, mas Ordinária (1981) | Braz Chediak
Para enfrentar a censura imposta pelo regime militar, os cineastas utilizavam técnicas narrativas ambíguas e metáforas, o que lhes permitia questionar o governo e a sociedade brasileira de forma mais sutil. Contudo, a censura era notória por sua arbitrariedade e ineficiência, possibilitando que alguns filmes com conteúdo crítico fossem lançados, enquanto outros mais inofensivos acabassem censurados. Os cineastas brasileiros da década de 1970 mostraram grande resiliência e criatividade ao lidar com os obstáculos impostos pelo regime militar.
Além dos diretores mencionados, outros nomes notáveis dessa época englobam Arnaldo Jabor, responsável por “Toda Nudez Será Castigada” (1973), uma crítica à hipocrisia social, envolvendo um viúvo que se envolve com uma prostituta; e Bruno Barreto, que dirigiu “O Beijo no Asfalto” (1980), uma adaptação da peça de Nelson Rodrigues, que explora a tragédia e a solidão humanas através de um homem acusado injustamente de ser homossexual. Arnaldo Jabor também dirigiu “O Casamento” (1976), que aborda a decadência moral de uma família burguesa através de um enredo envolvendo traições e conflitos familiares.
Toda Nudez Será Castigada (1973) | Arnaldo Jabor
O Beijo no Asfalto (1980) | Bruno Barreto
O Casamento (1976) | Arnaldo Jabor
Início do Cinema da Retomada (anos 80 do século XX)
A década de 1980 foi um período de grandes mudanças no cinema brasileiro, marcada pelo início do processo de redemocratização do país, pela crise econômica e pelo declínio significativo na produção cinematográfica. O fim da popular Pornochanchada e a crescente concorrência de filmes estrangeiros, especialmente os estadunidenses, contribuíram para essa diminuição na quantidade de filmes produzidos no Brasil.
Dentro do contexto do “Cinema da Retomada”, um movimento que visava revitalizar a produção cinematográfica brasileira através de temáticas e estilos inovadores, diretores como Cacá Diegues, Hector Babenco e Leon Hirszman tiveram papéis fundamentais. Filmes icônicos dessa época incluem “Bye Bye Brasil” (1980), de Cacá Diegues, que retrata a jornada de um grupo de artistas itinerantes pelo interior do Brasil em busca de melhores condições de vida; “Pixote: A Lei do Mais Fraco” (1981), de Hector Babenco, um drama social que aborda a vida de crianças marginalizadas enfrentando violência e pobreza nas ruas de São Paulo; “Eles Não Usam Black-Tie” (1981), de Leon Hirszman, um emocionante relato sobre a luta de uma comunidade operária contra a exploração e as adversidades econômicas; e “O Beijo da Mulher-Aranha” (1985), também de Hector Babenco, um filme que explora a relação entre dois prisioneiros políticos com diferentes perspectivas, um homossexual e um ativista político, que compartilham uma cela durante a ditadura militar. Esses filmes marcantes demonstram o engajamento social e a criatividade dos cineastas brasileiros durante esse período.
Bye Bye Brasil (1980) | Cacá Diegues
Pixote: A Lei do Mais Fraco (1981) | Hector Babenco
Eles Não Usam Black-Tie (1981) | Leon Hirszman
O Beijo da Mulher-Aranha (1985) | Hector Babenco
Cinema da Retomada (anos 90 do séc. XX)
A década de 1990 foi um período de renascimento para o cinema brasileiro, à raiz de mudanças políticas e econômicas, como o Plano Real, que estabilizou a economia e controlou a inflação e propiciou o surgimento de políticas públicas e iniciativas privadas voltadas para o setor cinematográfico. Nesse cenário, cineastas e diretores como Walter Salles, Fernando Meirelles, Carlos Diegues, Guel Arraes, Andrucha Waddington e Lais Bodanzky emergiram como figuras proeminentes no panorama cinematográfico brasileiro. Eles abordaram temas sociais, políticos e culturais, adotando novas estéticas e experimentando diferentes gêneros, como comédias, dramas e filmes históricos.
Alguns dos filmes mais importantes e bem-sucedidos desta época incluem “O Quatrilho” (1995), dirigido por Fábio Barreto, uma história de amor e traição no sul do Brasil, que foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro; “Carlota Joaquina, Princesa do Brasil” (1995), dirigido por Carla Camurati, um retrato satírico da vida da princesa Carlota Joaquina e sua relação com a corte portuguesa no Brasil, considerado um marco na retomada do cinema nacional; “O Que É Isso, Companheiro?” (1997), dirigido por Bruno Barreto, baseado no sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil durante os anos 1960 e também indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro; “Central do Brasil” (1998), dirigido por Walter Salles, que conta a história de uma mulher que ajuda um menino a encontrar seu pai no interior do Brasil e recebeu o Urso de Ouro no Festival de Berlim e duas indicações ao Oscar.
O Quatrilho (1995) | Fábio Barreto
Carlota Joaquina… (1995) Trailer | Carla Camurati
O Que É Isso, Companheiro? (1997) | Leon Hirszman
Central do Brasil (1998) Trailer | Walter Salles
Os cineastas da década de 1990 exploraram questões sociais e políticas, contribuindo para uma maior conscientização e compreensão do Brasil e sua diversidade cultural. Houve uma busca por uma linguagem cinematográfica própria e autêntica, que refletisse a realidade e a diversidade do Brasil, o que permitiu que o público se identificasse com as histórias e personagens apresentados.
Cinema Contemporâneo (séc. XXI)
O cinema brasileiro do século XXI apresenta uma série de cineastas talentosos e filmes notáveis que tem alcançado sucesso tanto no Brasil quanto no cenário internacional. Nesse contexto, diversos diretores e suas obras se têm destacado, contribuindo para a rica diversidade temática e regional do cinema nacional.
Fernando Meirelles e Kátia Lund se destacaram com “Cidade de Deus” (2002), um filme que retrata a vida nas favelas do Rio de Janeiro e a ascensão do tráfico de drogas. A obra recebeu aclamação internacional e foi indicada a quatro prêmios da Academia, incluindo Melhor Diretor e Melhor Roteiro Adaptado.
Cidade de Deus (2002) | Fernando Meirelles e Kátia Lund
José Padilha, conhecido por seus filmes “Tropa de Elite” (2007) e “Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro” (2010), trouxe à tona temas como a violência, corrupção e problemas sociais no Brasil. O primeiro filme da série conquistou o Urso de Ouro no Festival de Berlim e alçou o diretor à fama.
Tropa de Elite (2007) | José Padilha
Tropa de Elite 2 (2010) | José Padilha
Kleber Mendonça Filho é outro cineasta de destaque no cenário brasileiro. Ele dirigiu “O Som ao Redor” (2012), um retrato da classe média brasileira e da persistente tensão social no país. Seu filme “Aquarius” (2016), estrelado por Sonia Braga, recebeu aclamação da crítica e participou da competição principal do Festival de Cannes. Mais recentemente, Mendonça Filho co-dirigiu com Juliano Dornelles o filme “Bacurau” (2019), uma obra que mistura gêneros e aborda a luta de um pequeno vilarejo no sertão brasileiro. “Bacurau” conquistou o Prêmio do Júri no Festival de Cannes.
O Som ao Redor (2002) | Kleber Mendonça Filho
Aquarius (2016) | Kleber Mendonça Filho
Bacurau (2019)- Trailer | Kleber Mendonça Filho
Selton Mello é um ator e diretor de renome no Brasil, conhecido por seu trabalho em filmes como “O Palhaço” (2011) e “O Filme da Minha Vida” (2017). Suas obras combinam elementos de comédia, drama e emoção, trazendo reflexões sobre a vida, a arte e as relações humanas.
O Palhaço (2011) | Selton Mello
O Filme da Minha Vida (2017) | Selton Mello
Outros cineastas importantes incluem Anna Muylaert, que dirigiu “Que Horas Ela Volta?” (2015), um filme que aborda a dinâmica entre empregados domésticos e seus empregadores no Brasil, e Karim Aïnouz, cujo filme “A Vida Invisível” (2019) ganhou o prêmio Un Certain Regard no Festival de Cannes, retratando a relação entre duas irmãs no Rio de Janeiro dos anos 1950.
Que Horas Ela Volta? (2015) | Anna Muylaert
A Vida Invisível (2019)- Trailer | Karim Aïnouz
O cinema brasileiro do século XXI tem sido marcado não apenas pela diversidade temática e regional, mas também pela inclusão de vozes e perspectivas de grupos historicamente marginalizados. Diretores e filmes do cinema LGBTI+, cinema indígena e cinema afro-brasileiro têm ganhado destaque, contribuindo para um panorama cinematográfico mais rico e representativo.
No cinema LGBTI+ brasileiro, um dos diretores mais notáveis é Daniel Ribeiro, que dirigiu o curta-metragem “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” (2014). O filme retrata a história de amor entre dois adolescentes e aborda questões como identidade, sexualidade e deficiência. A obra recebeu aclamação internacional e ganhou o Prêmio Teddy no Festival de Berlim. Karim Aïnouz é outro cineasta importante que abordou temáticas LGBT+ em seus filmes. “Praia do Futuro” (2014), estrelado por Wagner Moura e Clemens Schick, explora a relação entre dois homens de diferentes culturas e a busca por identidade e aceitação.
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (2014) | Daniel Ribeiro
Praia do Futuro (2014) | Karim Aïnouz
No que diz respeito ao cinema indígena, uma figura de destaque é a diretora Maya Da-Rin com seu filme “A Febre” (2019). A obra retrata a vida de um indígena deslocado que vive na cidade de Manaus, abordando temas como a urbanização e a preservação da cultura indígena. “A Febre” foi premiado em diversos festivais de cinema internacionais, incluindo o Festival de Locarno. Outra produção que aborda a questão indígena é “Martírio” (2016), dirigido por Vincent Carelli em colaboração com Ernesto de Carvalho e Tita. O documentário investiga o processo de demarcação das terras do povo Guarani-Kaiowá no Brasil e expõe a violência e a resistência enfrentadas pelos indígenas.
A Febre (2019)[Trailer] | Maya Da-Rin
Martírio (2016) [Trailer] | Vincent Carelli
O cinema afro-brasileiro também tem sido fortalecido por cineastas talentosos. Yasmin Thayná, diretora do curta-metragem “Kbela” (2015), explora a relação das mulheres negras com seus cabelos e a luta contra o racismo e a discriminação. Já o diretor Jeferson De, em “M8 – Quando a Morte Socorre a Vida” (2020), aborda questões de identidade racial e social por meio da história de um estudante negro de medicina. A diretora Sabrina Fidalgo também merece destaque com seu curta “Rainha” (2016), que examina temas como a diáspora africana e a busca por pertencimento. Além disso, “Café com Canela” (2017), dirigido por Ary Rosa e Glenda Nicácio, traz à tona a representatividade negra e a resiliência das mulheres negras no interior da Bahia.
Kbela (2015) | Yasmin Thayná
M8 – Quando a Morte Socorre a Vida (2015) | Jeferson De
Rainha (2016) – Trailer | Sabrina Fidalgo
Café com Canela (2017) – Trailer | Ary Rosa e Glenda Nicácio
Esses cineastas e filmes representam um avanço significativo no cinema brasileiro do século XXI. As produções citadas contribuem para a evolução da indústria cinematográfica nacional, abordando temas relevantes ao incluir vozes e histórias de grupos muitas vezes sub-representados, isso faz com que se amplie o alcance e a relevância do cinema nacional, oferecendo perspectivas diversas e enriquecedoras para o público.